segunda-feira, janeiro 31, 2011

Dia sem sol em Nikity.
Tomei os remédios.
Vou fazer um purê de abóbora.
Eu e Pedro estamos refazendo um vídeo da minha música com Suely Mesquita, “Vai Querer?”, do disco Lua Singela. Pedro é incrível, ele abriu o programa e começou a aprender.
Eu tentei, mas não rolou.
Aí, eu fico em volta, feito mosca.
As imagens trouxemos de nossa viagem a Salvador, em outubro, quando conhecemos, pessoalmente, o
Tarcísio e o Lima. E a gente ta enrolando assim, porque eu transformei a edição em um trabalho escolar, aí, quero tirar uma nota bem legal.
Eu disse:
- Pode ser um vídeo? – e o professor:
- Se você teorizar a respeito, sim – e tou lendo uns livros que me ajudam a bolar um texto que justifique o clipe, ta se ligando, bom leit@r?
O link do vídeo com a literatura é que ambos são narrativas, se liga...

sexta-feira, janeiro 28, 2011

Manhã sem frescor algum, com a vizinhança reclamando já de manhã.
O vizinho de baixo, que faz gaiolas e que prende passarinhos, está embaixo de minha janela e Seu Valmir está perto, cantando baixinho hinos de louvor. De vez em quando puxam conversa, ouço daqui palavras soltas.
Ontem de noite, Pedro veio e instalou outro word no meu PC, que ficou sem problemas pra escrever.
Ainda guardo comigo um crânio de gato que achei na praia, quando era adolescente.
Estou suando.
Fui.

quinta-feira, janeiro 27, 2011

Manhã fresquinha de verão cheio de lembranças.
Ontem, à noite, assisti a um documentário sobre as conquistas da cultura humana.
Que o homem se distinguiu dos chimpanzés pela habilidade do polegar, pela diferenciação do aparelho fonador, que permitiu o ar pela boca, pelo tamanho do cérebro que permitiu o circuito da fala e tal.
Por isso, aperfeiçoei meu post de um tempo atrás e repito ele com as modificações:

Pensar a linguagem verbal humana (oral e escrita), essa forma que o ser humano encontrou de abstração e que, ao mesmo tempo, costura-o à natureza (de que se afastou) e a seus semelhantes e pensar esse modo que encontrou de, através dela, criar e descobrir interpretações diversas de realidade ou o modo que encontrou de apenas se comunicar, quer dizer, pensar este tecido verbal, forjado através das gerações, com suas camadas de dor, sonho, objetividade ou prazer, que, em última instância, lhe dão sentido, é pensar o próprio homem, a humanidade, com seus mistérios ou suas caras já reveladas, suas faces aparentes.
Sendo assim, eis duas visões distintas, uma divina, outra humana, mas que no fundo, dizem a mesma coisa sobre nós, a saber, palavras criam realidades:


No Santo Evangelho segundo São João:

O verbo se fez Carne

1 No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus e o Verbo era Deus.
2 Ele estava no princípio com Deus.
3 Todas as coisas foram feitas por ele, e sem ele nada do que foi feito se fez.
4 Nele estava a vida e a vida era a luz dos homens.


N’A História do Diabo, de Vilém Flusser:

Pg 160

1.7. Língua

A vontade tende. Pressiona. Quer explodir. É sedenta. Quer espalhar-se. Está em tensão. Procura sair de si mesma. Quer projetar-se. Procura poder. Quer realizar-se. Exprime-se e expressa-se. Articula-se. A vontade torna-se língua. A vontade tornada língua cria mundo e mente.

quarta-feira, janeiro 26, 2011

Alguém fazendo obra na vizinhança.
Enquanto fazia meu café, o dia lindo de verão, me fez, outra vez, lembrar das casas fresquinhas das amigas de mamãe.
Minha mãe começava muitas frases assim:
- Naquela época, eu tinha uma amiga...- e tal.
Mais um sonho com mamãe.
Antigamente, na roça, mamãe, lavando roupa dentro do rio, batia as roupas nas pedras. Eu tinha que dar leite pra umas crianças. Eu batia os sacos de leite nas pedras, mas não sabia se estava certo. Mamãe estava do outro lado do muro e gritei-lhe feito um bezerro:
- Mãããããe? Como é que é certo bater esse leite na pedra – e ela respondeu:
- Não precisa bater, luís. Dê o leite às crianças!
Ehhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh!

terça-feira, janeiro 25, 2011

Aos poucos a casa vai se estragando e é preciso estar sempre a consertar um troço e outro e tal. Enquanto eu lavava louça, estive pensando nisso e pensando como as louças são tão antigas e vem sendo lavadas pelos séculos afora e me lembrei de quando eu era um menino e visitava as casas das amigas de mamãe e via as louças que iam pras pias serem lavadas e eu lavando as minhas louças, aqui, depois do almoço e, silencioso leit@r, foi ótimo!
Então, as casas vão se estragando e é preciso consertar e já faz tempo que fiz uma lista de coisas pra fazer e fui me entusiasmando e listando as coisas que poderiam acontecer pra mim, os meus desejos, tudo, e pendurei na geladeira. À medida que vou conseguindo realizar algum item de minha lista, o meu prazer é grande em retirá-la do ímã prendendo-a à geladeira e riscá-la no item realizado.
Alguns itens ficam anos sem que eu consiga ter o prazer de riscá-los, mas não os perco de mira, quer dizer, um dia risco.
E no domingo, Pedro veio e colou os plásticos que há anos estavam se descolando no piso do quarto e sala. Ele fez um trabalho primoroso, enquanto eu ficava em volta, feito uma mosca.
Pedro arrebentou!
Quer dizer, item riscado: colar chão.
Incrível!

domingo, janeiro 23, 2011

Sonho muito com mamãe, que me abraça deliciosamente.
Às vezes, perco o contato e não consigo lhe falar no telefone.
Essa noite ela me deu seu e-mail:
porqueagenteexiste@luzia.com.br

sexta-feira, janeiro 21, 2011

Recebi um prêmio, generoso leit@r!
Ele veio de Madame Beleza, que por sua vez ganhou de Stephie B.
É um prêmio e é um jogo.
Eis as regras:
a- linkar a pessoa que o indicou.
b- listar sete coisas sobre você mesmo:

Então, vamos lá:

1. Escrevo no Blog Azul, quase todas as manhãs.


2. Escrevo sempre acompanhado de meu pote de café.

3. Onde escrevo, meu quarto, pega o sol da tarde e no verão é impossível dormir aqui.

4. Porque levei minha cama pra sala, tenho podido aproveitar a visão da janela de meu quarto. E sinto grande prazer em me debruçar nela pra olhar o casario de lâmpadas acesas, aproveitando a fresca lá de fora, desse pedaço de vale, à noite.

5. Minha vizinhança é barulhenta e o insuportável é quando os meninos jogam bola no corredor. Jogaria todos fora, no lixo!

6. Adoro dormir muito e sou lento, quieto, parado.

7. Faço minha própria comida.


Blogs a que dou esse Prêmio:

1-
Blog do Senhor Maven
2- Blog do Tarcísio
3- Blog do Shiraga

quinta-feira, janeiro 20, 2011

Então, do mesmo modo que a abstração nos separa da realidade, ela pode nos aproximar dela, como é o caso já dito da geometria fractal, que se afasta(representa) aproximando. Além do que, é através da linguagem(por excelência uma abstração), no crochê da conversação humana sobre a face do planeta, que penetramos, nos aproximamos da realidade do outro.
A esse respeito, veja o que diz n’A História do Diabo, Vilém Flusser:

“6.4.2. A conversação é um tecido que consiste de fios formados por palavras, e pontos de cruzamentos de fios, chamados “intelectos”. A palavra é a ponte que liga intelectos e aponta por seu significado, em última análise, para o fundamento inarticulado. Toda palavra é produto, é obra do esforço criador desse fundamento, é obra de arte diabólica informada e modelada...(...). Toda palavra é obra do esforço conjugado empreendido pelas incontáveis gerações de intelectos que nos antecederam. No curso da história do pensamento toda palavra tem sido modulada e amassada sem cessar pelos intelectos incontáveis que dela se utilizaram para se realizarem. Toda palavra é testemunha viva da história do pensamento. Nesse sentido é toda palavra o integral do pensamento...

6.4.3. O exército das palavras forma e cerra fileiras em obediência a regras. As fileiras são chamadas “frases”, e as regras “gramática”, e é graças a essa organização que o exército das palavras avança. O rito pelo qual as palavras se organizam em frases é responsável pela consistência da realidade do intelecto...(...). A mente humana, essa suprema ilusão de realidade, é a obra mais perfeita do diabo, e é nesse sentido que a nossa insistência avarenta na manutenção de nossa individualidade é o triunfo supremo do diabo. O nosso empenho em prol da língua(que é o empenho em prol do nosso intelecto), e nosso empenho em prol do enriquecimento da língua(que é o empenho em prol da imortalidade do nosso intelecto), é o ponto culminante da carreira gloriosa do diabo. A superação da língua, que seria o abandono do intelecto, implica a perda da nossa individualidade, e, do ponto de vista oposto ao diabo, a salvação de nossa alma.”

Quer dizer, bom leit@r, para que se penetre a realidade será preciso ser um Buda, sem abstrair nem pensar, nem rir nem falar...
- Hein?!!

quarta-feira, janeiro 19, 2011

Enquanto a oralidade e a linguagem matemática tradicional(o sistema euclidiano de representação ou a matemática de Isaac Newton) se desenvolveram a partir de conceituações muito abstratas, incapazes de apreender a natureza das coisas(como fossem as borboletas, flores que se distanciaram da terra, segundo Rudolf Steiner), a língua escrita e a geometria fractal têm direção inversa, porque, para Flusser, inventou-se a escrita a partir do desfiamento de camadas da imagem. Quanto à geometria fractal, como já foi dito, esta desenvolveu-se a partir da possibilidade de entrar na dimensão existente entre dois pontos ou planos ou números. Quer dizer, enquanto as primeiras afastam-se, as segundas se aproximam, penetram, entram na dimensão do real.
Como já insinuei serem as palavras instrumentos de penetração, no curso das idéias que, aqui, tento desenvolver, a esse respeito, sobre penetração, gostaria de transcrever outro trecho do A História do Diabo, de Vilém Flusser::


“2.4.6. As mãos que os diversos tipos de átomos estendem para alcançar realidade de vez em quando se encontram. Aí se agarram uma as outras para formar moléculas de diversos tipos. Moléculas são pedrinhas(mecanicamente indestrutíveis) que compõem a matéria, são portanto finalmente algo de concreto, embora nunca ninguém tenha tido a experiência vivencial da molécula isolada. A concreticidade da molécula não é portanto tão enormemente impressionante. Como será que se encontram as mãos para formar esses pedacinhos concretos? O mito da química recorre ao mito de Demócrito para explicar esse milagre ontológico inconcebível. As mãos são os ganchos dos átomos duros desse grego arcaico devoto, falsamente interpretado como pai do materialismo. Os átomos flutuam no nada qual flocos de neve, e quando, por “acaso”, se encontram formam realidade, porque seus ganchos se agarram. A realidade é uma espécie de crochê, e o nada a infiltra de todos os lados e por todos os poros. E o “acaso” desse crochê é o mesmo que produziu a terra. Algumas das moléculas têm estrutura simples. São formadas por poucas mãos que se agarram de maneira simples. Outras estruturas são extremamente complexas. Não se trata somente de saber quais são os átomos que entram na combinação, mas também de que direção e de que forma entram. É o antigo problema do espaço que entra em jogo. Os desenhos que químicos nos fazem dessas estruturas diabólicas lembram vivamente figuras paranóicas ou mandalas tibetanas. Modelos tridimensionais de moléculas lembram a chamada “escultura abstrata”. Os átomos são, nesses modelos, representados por bolas, e as suas mãos por barras. Mas deve ficar claro que essas bolas e barras não simbolizam “realidades”, mas realidades in statu nascendi. O que é “real”, quimicamente, é apenas a estrutura. Esses modelos são a demonstração sensível do esforço diabólico de transformar “ser puro” em fenômeno sensível. Mas é possível encarar esses modelos igualmente de um nível ontológico diferente. É possível dizer-se que as bolas nesses modelos representam seres individuais que se tornam reais somente em sociedade. São zoa politika cuja realidade é a sociedade chamada “molécula” neste exemplo. Esse nível ontológico, o qual podemos chamar “social”, nos desvenda uma realidade inteiramente nova. As moléculas não passam de fenômenos estruturalmente homomórficos com fenômenos como é o organismo vivo. Nele os órgãos são apenas condição virtual do organismo. O órgão isolado carece de realidade. O mesmo pode ser dito quanto ao “ambiente” da ecologia. O “ambiente” como estrutura é a única realidade, e as “coisas” que compõem o “ambiente”, por exemplo as árvores, os animais, os riachos, as nuvens e o chão de uma floresta, não passam de virtualidades da realidade que é a floresta. Podemos ainda dizer o mesmo quanto à sociedade humana. O indivíduo humano não passa de condição virtual da realidade que é a sociedade. Em uma palavra: a realidade está na estrutura. É o que o modelo das moléculas se esforçam por demonstrar aos sentidos.”
Vilém Flusser em A história do diabo.

terça-feira, janeiro 18, 2011

Nesse ponto, onde se comenta o aspecto luxuriante da geometria fractal que ao penetrar entre as dimensões dos pontos, das linhas, dos planos e dos sólidos, então, consegue descobrir e representar a geometria em desordem da natureza, e em resposta a minha pergunta sobre a geometria da língua escrita, vale lembrar o que disse Vilém Flusser a respeito do surgimento da escrita, em seu ensaio intitulado Filosofia da Caixa Preta, de 1985.
Para Vilém Flusser, a língua escrita surgiu a partir do empenho, no segundo milênio antes de Cristo, em se rasgar a imagem “a fim de abrir a visão para o mundo concreto escondido nelas. O método de rasgamento consistia em desfiar as superfícies das imagens em linhas e alinhar os elementos imaginísticos. Eis como foi inventada a escrita linear. Tratava-se de transcodificar o tempo circular da imagem em linear, traduzir cenas em processos”.
Assim, a escrita surge da sistematização de recortes encontrados nos contornos da superfície das imagens, quer dizer, o processo de entrar entre os pontos e linhas das superfícies da realidade é o mesmo da geometria fractal, né, não?.

segunda-feira, janeiro 17, 2011

A respeito da desordem da vida, da natureza, da realidade e voltando ao livro de Arlindo Machado A Arte do Vídeo, 1988, encontrei na página 149:
“Quando o computador gráfico distribui de forma aleatória as folhas de uma árvore, ou cria a nodosidade num tronco, ou desenha a forma irregular de uma montanha, a figura obtida como resultado parece demasiadamente “caótica” se comparada com o modelo natural. Ora, isso parece dizer que, a despeito da aparente gratuidade, as formas da natureza, mesmo aquelas mais selvagens e amorfas, devem ter alguma espécie de organização secreta...(...). Que geometria misteriosa é essa que rege a construção do contorno desigual de uma montanha e distribui escarpas, pontas e fossos em sua superfície? A resposta parece que começa a ser vislumbrada com o surgimento da surpreendente geometria fractal.”


E eu pergunto, bom leit@r: O que dizer da geometria da língua escrita? Estaria ela, com suas irregularidades de contorno, seus fossos e pontas, mais próxima da desordem do mundo?

Continuando o Arlindo Machado...

“Essa geometria(fractal) de história recentíssima constitui um sistema matemático tão poderoso que parece ser capaz de descrever e representar as estruturas de fenômenos naturais resistentes à formalização, como o contorno de uma montanha, a distribuição das folhas numa árvore, o mapeamento das crateras lunares e até mesmo a distribuição das galáxias, o padrão dos fluidos e a configuração das turbulências. Desenvolvida e sistematizada pelo polonês Benoit Mandelbrot, a geometria fractal traz à luz processos dinâmicos não-lineares que estão colocando em xeque as últimas garantias do sistema euclideano de representação. Como se sabe, a geometria clássica trabalha com categorias abstratas convencionais, a rigor inexistentes na natureza e a ela inteiramente estranhas, como é o caso dos pontos, das linhas, dos planos e dos sólidos regulares. A maioria esmagadora dos objetos técnicos forjados pelo homem reproduz essas categorias: suas formas são lisas, regulares e “funcionais”, pois a sua própria finalidade é materializar funções matemáticas ou conceitos científicos. A natureza, entretanto, sempre resistiu à redução geométrica, donde o enorme dificuldade de descrever os seus fenômenos a partir de categorias carregadas de módulos de ordem e disciplina. Basta observar como se comportam os galhos rugosos e retorcidos das árvores, o perfil flamejante das chamas, a distribuição dos cúmulos estelares, a forma das nuvens e a textura do relevo terrestre. Em comparação com os modelos geométricos a natureza parece caótica, desorganizada, moldada por mil artimanhas do acaso, imprevisível em última instância. Ora, a geometria fractal, em sintonia com o que há de luxuriante no mundo natural, aboliu os pontos, as linhas, os planos e os sólidos substituindo-os por processos complexos e dinâmicos que se dão entre essas dimensões. Assim, descobriu ela que a dimensão fractal de certas superfícies rugosas ou irregulares é algo intermediário entre as dimensões 0 e 1, 1 e 2, 2 e 3 ou mesmo 3 e 4, ou seja, um número fracionário ou um inteiro “anormal” ou ainda um número irracional, descritivo de um estado irregular ou interrompido. Se não for muito grosseira a comparação, podemos dizer que a geometria fractal se ocupa de algo como retas tortas e planos amassados.
(...) A geometria fractal traz de volta à cena filosófica um princípio básico do pensamento oriental, segundo o qual a parte já contém o todo(...).

sábado, janeiro 15, 2011

Então, a matemática celeste, segundo Vilém Flusser, não se traduz exatamente na ordem matemática de Isaac Newton. E na superfície ordenada do sistema das línguas humanas, segundo o poeta Ferreira Gullar, não se traduzem os fenômenos do mundo em sua profundidade e em sua desordem.
Entretanto, pensando no que disse Ferreira gullar a respeito da experiência fauvista de Henri Matisse (disse que o homem só inventou a pintura, porque existe uma parte da experiência humana que não se traduz em palavras) e, segundo Arlindo Machado no seu A Arte do Vídeo, Editora Brasiliense, 1988, “(...) a pintura e a fotografia podem restituir o mundo em sua complexidade e desarmonia, com todos os acidentes do acaso e as irregularidades que moldam a face das coisas. Sabe-se que os teóricos da imagem sempre acentuaram o caráter “não codificado” das artes visuais: a imagem de uma árvore, dizem eles, é sempre alguma coisa particular, ambígua, polissêmica, esculpida por mil caprichos do acaso e em nada se parece com o desenho de outra árvore, mesmo que da mesma espécie. Duas árvores representadas em desenhos diferentes nunca mostram a mesma nodosidade nos troncos nem a mesma distribuição das folhas nos galhos ou dos galhos nos troncos. Diferentemente, portanto, da palavra “árvore” que é um conceito geral, abstrato e designa todas as árvores existentes ou existidas, sem se referir a qualquer árvore singular. Em síntese, enquanto a palavra teria como destino o conceito formal abstrato, a imagem estaria mais ligada à natureza concreta das coisas particulares, a despeito de todas as convenções de representação.”
Nesse sentido, a pintura de Henri Matisse está mais próxima da desordem da vida do que poderia estar próximo da vida o sistema codificado da língua portuguesa e do que poderia estar, como falava Vilém Flusser, a abstração matemática de Isaac Newton próxima da ordem imperfeita das esferas celestiais.
Ainda segundo Vilém Flusser, na sua A história do diabo:
“A desordem é própria da vida. A ordem é inimiga da vida, é a própria morte. Ordenar vida significa matá-la.” -pg 41.

sexta-feira, janeiro 14, 2011

Maria Braga me mandou e-mail.
Aqui.
“Vou reunir músicas de Jards Macalé, Itamar Assumpção e Luiz Capucho, artistas injustamente rotulados como malditos, misturando com Tono e um rapaz de ...







quinta-feira, janeiro 13, 2011

Sim, não existe ordem na natureza das coisas, mas apenas na tradução dessa natureza pela cultura humana: nas línguas, nas artes, na arquitetura das cidades, na arrumação de meu guarda-roupa, nas ciências...
A mente humana é um filtro que organiza a realidade e cada cultura, cada língua, cada gênero artístico, cada guarda-roupa, cada época, tem a sua forma própria de organização.
A esse respeito Vilém Flusser filosofa no seu A história do diabo(1965):

“(...) A nossa tradição ocidental louva a harmonia das esferas como obra divina. Deve portanto chocar o leitor que a nossa argumentação se veja forçada a concluir atribuindo essa harmonia ao diabo. Um instante de meditação amenizará o choque. O que admiramos no céu estrelado não é sua ordem, mas a sua duração gigantesca. Comparada com a duração de nossa vida, são as esferas celestes efetivamente eternas. Essa sua relativa eternidade é o que nos parece divino. Sabemos, no entanto, que se trata de um engano nosso. Os astros são fenômenos temporais, como tudo neste mundo dos sentidos. Com efeito, os astros são “imperpetua mobília” como as máquinas que produzimos. Reduzidas as dimensões e a duração, não passa o céu estrelado de um exemplo das máquinas que ultimamente nos são fornecidas pela nossa tecnologia. Com uma diferença apenas: as nossas máquinas funcionam geralmente com exatidão maior que a máquina celeste, fato que os astrônomos constatam com um leve sorriso. Seria blasfêmia atribuir essa máquina imperfeita ao criador divino. Com o mesmo direito poderíamos atribuir-lhe as nossas máquinas destinadas a produzir instrumentos ou mortes. Não, a máquina gigantesca dos astros é obra do diabo. E o nosso parque industrial é sua prole tardia. Os nossos aparelhos são cópias aperfeiçoadas do padrão diabólico que aparece, todas as noites, acima de nossas cabeças. São cópias mais refinadas, já que produtos de um esforço criador de um diabo mais maduro.
Enquadremos Newton nessa ordem de idéias. É o descobridor provisório da estrutura da máquina celeste. Essa estrutura é articulável em proposições matemáticas simples. O funcionamento da máquina diverge dessas proposições em porcentagens pequenas, mas apreciáveis. Newton atribuía a autoria da máquina a Deus, disse, portanto “God is a mathematician”. O autor da máquina celeste é, com efeito, um matemático talentoso, mas um matemático imperfeito.(...) A descoberta da estrutura matemática nos fenômenos astronômicos é muito satisfatória para o espírito pesquisador humano. Graças a essa descoberta reconhecemos nas estrelas um espírito semelhante ao nosso. Com efeito, reconhecemos nas estrelas o diabinho que nos inspira no íntimo das nossas mentes pesquisadoras. (...) É por isto que a contemplação do céu estrelado é, para nós, uma espécie de auto-reconhecimento. Esta é uma das explicações da atração que as estrelas sobre nós exercem. A outra explicação é a seguinte: o esboço newtoniano da estrutura celeste está sendo superado. Estamos começando a nos convencer de que seríamos capazes de construir uma máquina celeste bem mais perfeita. Com efeito, já iniciamos as tentativas nesse sentido, e os nossos satélites artificiais e “guided missiles” são os primeiros sintomas dessas tentativas. É que o diabinho em nós amadureceu e procura, por nosso intermédio, retificar as criancices que cometeu.”

quarta-feira, janeiro 12, 2011

Ainda filosofia...

Então, se existe uma parte da experiência humana que não se traduz em palavras, uma parte impossível de ser submetida à organização das palavras e que, a despeito disso, poderia se submeter à ordem das cores, ou seja, se existem sensações impossíveis de tradução por palavras, mas possíveis de tradução num quadro de Henri Matisse, eu conseguiria decidir sobre que tipo de realidade é essa, possível de ordem com as palavras e outra apenas possível de tradução na ordem das cores?
E se eu organizasse o meu guarda-roupa em palavras, a ordem traduzida em palavras é verdadeira ou apenas uma ordem de ficção?
Como ajustar a ordem das palavras à desorganização da realidade de que fala o poeta Ferreira Gullar?
E o meu guarda-roupa organizado com gavetas para as camisetas, cabides para casacos e calças etc, fora das palavras estaria em desordem?
Hein?

segunda-feira, janeiro 10, 2011

Mais sobre as palavras:
" Ao comentar um quadro de Henri Matisse, o crítico de arte ferreira gullar, diz: O homem só inventou a pintura, porque existe uma parte da experiência humana que não se traduz em palavras."

sábado, janeiro 08, 2011

Depois de Wittgenstein, a respeito da representação da realidade pela linguagem, com a palavra, um poeta:

“O cheiro do jasmim é uma desordem. Quem dá ordem é a palavra.(...) A linguagem é uma ordem, é um sistema. Fora da linguagem só há desordem. Como expressar, então, o que está fora do sistema? Como captar essa desordem? A linguagem só diz o que a linguagem diz. O que está fora dela, não entra. Então, fica o não dito pelo dito. Fica um pensamento daquele mundo, que não tem nada a ver com a realidade. Um pensamento que se passa à margem da realidade.(...) Eu tenho prazer em viver a aventura poética. São descobertas que enriquecem a vida e enriquecem os outros. Eu tremo na expectativa do que vai acontecer, do que pode ser o processo. Tenho prazer o tempo todo, eu tremo, mas não sofro. Ninguém me manda fazer isso. Eu faço, porque quero. Mas não escrevo quando quero, senão, não é poesia. Quando entro na poesia, sinto um grande prazer. Sinto muito prazer em viver essa experiência extraordinária de revelação. Claro, às vezes atravesso noites me perguntando: Qual é o caminho? Qual é a solução? Mas essas dúvidas também são prazerosas. Estou fazendo algo que pode ser bonito, que pode ser comovente.”
Ferreira Gullar em entrevista ao jornal O Globo – 29 de agosto de 2010.

sexta-feira, janeiro 07, 2011

Ontem, nas horas em que fiquei na espera de ser atendido pelo médico, fiquei lendo "Investigações Filosóficas" do Wittgenstein. É muito difícil apreender o processo de pensamento de outra pessoa. Minha sensação é a de que todas as pistas abertas por aquele pensamento se desfizeram e de que fiquei outra vez sem caminho. Ô louco!
Tentei pescar uma frase. Eis ela:

300. Ao jogo da linguagem com as palavras “ele tem dores” pertence- diríamos- não apenas a imagem do comportamento, mas também a imagem da dor. Ou: não apenas o paradigma do comportamento, mas também o da dor. – Dizer “a imagem da dor entra no jogo de linguagem com a palavra “dor” é um mal entendido. A representação da dor não é nenhuma imagem e esta representação não é substituível, no jogo da linguagem, por algo que chamaríamos de imagem. – Certamente, a representação da dor entra, em certo sentido, no jogo da linguagem, apenas como não imagem.

301. Uma representação não é uma imagem, mas uma imagem pode corresponder a ela.

quarta-feira, janeiro 05, 2011

Depois das festas de final de ano, depois da febre de cinco dias, me sinto como descarrilado.
Preciso retomar o prumo.
Possivelmente, nada tenha saído do rumo. É uma sensação.
Feliz 2011, bom leit@r!

terça-feira, janeiro 04, 2011

Entretanto, para certa tradição do pensamento, porque não existe significação fora das palavras, os significados são confundidos com o ser das coisas e por isso, se dizer que a linguagem cria realidade. Mas, parece as palavras serem apenas um plus sobre a natureza das coisas, como borboletas espirituais no jardim da realidade.
A esse respeito, sobre significado e ser, achei no Investigações filosóficas de Wittgenstein:

“239. Como pode ele saber que cor escolher quando ouve vermelho? – Muito simples: ele disse tomar a cor cuja imagem lhe venha ao espírito ao ouvir a palavra. – Mas como pode saber qual a cor cuja imagem lhe vem ao espírito? É necessário ainda um outro critério? ( Há contudo um processo: escolher a cor que lhe vem ao espírito ao ouvir a palavra...)
‘Vermelho’ significa a cor que me vem ao espírito ao ouvir a palavra ‘vermelho’. - seria uma definição. Nenhuma explicação da essência da designação por meio de uma palavra.”

Ou ainda, nesse outro trecho, em que o ser do objeto se perde totalmente para a expressão:

“293. Quando digo de mim mesmo que sei o que significa a palavra ‘dor’ apenas a partir de um caso específico, - não devo também dizer isto de outros? E como generalizar um caso de modo tão irresponsável?
Ora, alguém me diz, a seu respeito, saber apenas a partir de seu próprio caso o que sejam dores! – Suponhamos que cada um tivesse uma caixa e que dentro dela houvesse algo que chamamos de ‘besouro’. Ninguém pode olhar dentro da caixa do outro; e cada um diz que sabe o que é um besouro apenas por olhar seu besouro. – Poderia ser que cada um tivesse algo diferente em sua caixa. Sim, poderíamos imaginar que uma tal coisa se modificasse continuamente. – Mas e se a palavra ‘besouro’ tivesse um uso para estas pessoas? – Neste caso, não seria o da designação de uma coisa. A coisa na caixa não pertence, de nenhum modo, ao jogo de linguagem nem mesmo como um algo: pois a caixa poderia também estar vazia. Não, por meio desta coisa na caixa, pode-se abreviar; seja o que for é suprimido.
Isto significa: quando se constrói a gramática da expressão da sensação segundo o modelo de objeto e designação, então o objeto cai fora da designação, como irrelevante.”


segunda-feira, janeiro 03, 2011

Como os fios que se conduzem dentro do circuito de eletricidade de maneira diferente de como se conduzem as forças das águas, das correntes dos rios, e acendem minha luz da sala, assim são diferentes as palavras das coisas.
Penso que a relação entre palavras e coisas, seja a mesma que Rudolf Steiner fez entre as borboletas e as flores:

“As borboletas são flores que se desprenderam da terra....e as flores são borboletas que a terra apreendeu...” (Rudolf Steiner)

domingo, janeiro 02, 2011

Finalmente, sem febre.
Pedro trouxe bananas e fez uma comidinha.
Vou dar uma organizada aqui...

sábado, janeiro 01, 2011

Mas do ponto de vista de Vilém Flusser, num paralelo com a cultura Clássica dos gregos, as palavras seriam uma espécie de fogo de Prometeu roubado aos deuses e entregue aos homens, porque para ele, a palavra não é divina, mas produto da vontade do homem de se auto-gerar e ao mundo.
E comecei a vislumbrar, a partir de uma primeira leitura das Investigações Filosóficas de Wittgeinstein, a idéia de que as palavras, diferente de como queria Santo Agostinho, através dos gregos, não representam algo além dela, tipo, algo oculto, dizendo de uma outra maneira, as palavras não representam as coisas, a coisa árvore não está no reverso da palavra árvore, assim como a correnteza dos rios não é o reverso da energia elétrica da lâmpada acesa na minha sala.
A luz acesa na minha sala não oculta e não significa a força da correnteza, porque ela já é outra coisa. E a imagem acústica da palavra árvore, iluminada em minha mente, é, absolutamente, independente da coisa árvore e se conduz dentro do sistema lingüístico de maneira, obviamente, diferente do modo como a coisa árvore existe dentro de seu ecossistema, de modo que eu possa usar dessa palavra quase como eu queira.
Como na trecho Passeio Nº 2 de Manoel de Barros:

PASSEIO N° 2
“Na voz ia nascendo uma árvore

Aberto era seu rosto como um terreno.”